06ª rodada – Entrevista com Flávia Rita

Erros de português: como evitar esse gol contra?
Arte: © Na cara do gol com Lucas Souza.

Erros de português: como evitar esse gol contra?

Marcar um gol contra é um erro comum no futebol.

Para quem ainda não sabe, é quando um jogador acaba desviando a bola para dentro do próprio gol, ou seja, marcando um gol para a equipe adversária. Sem querer, é claro.

Mas o que a maioria das pessoas ainda não sabem, também, é que, muitas vezes, acabam marcando um gol contra o próprio desenvolvimento, ao tropeçar na língua portuguesa, quando o maior dever naquele momento é acertá-la.

Estamos falando de uma entrevista de emprego, no dia a dia profissional, em um concurso público, em um vestibular. Lugares em que o nosso português deve ser impecável para que possamos conquistar resultados positivos.

E erramos, marcamos um gol contra. Está com medo de sofrer com isso?

Então, olho no lance!

Pois hoje nós vamos aprender um pouco mais sobre a importância da dedicação ao nosso idioma, os vícios que podem nos prejudicar e uma entrevista exclusiva com a professora Flávia Rita, camisa 1⚽ quando o assunto é língua portuguesa.

Erros de português: um risco que você corre

Por que erramos? Já parou para pensar nisso?

A resposta é simples: erramos porque corremos esse risco.

Errar é humano, e ninguém erra porque quer.

O grande X da questão é: o que eu posso fazer para errar menos. E esse processo é um ciclo.

Um jogador comete um erro como um gol contra porque corre esse risco. Sua ação busca um resultado positivo, que é afastar a bola em um ataque adversário.

O resultado, porém, não foi satisfatório. O que é necessário?

Levantar a cabeça e treinar mais.

Muitas vezes, erramos também porque simplesmente corremos o risco. Nos arriscamos em busca de um resultado positivo, em um vestibular, em um concurso, em um teste para um novo emprego.

Com a mente cheia, a ansiedade, erramos. O que fazer?

Praticar mais.

Paranoia gramatical: como escrever sem ficar louco

Eis, então, o possível grande problema: onde mais treinamos a nossa escrita, todos os dias?

Nas redes sociais, seja compartilhando um pouco sobre a nossa vida, criando conteúdo ou apenas batendo papo nos aplicativos de conversa.

E como é, muitas vezes, a nossa abordagem nesses cenários? Uma escrita fiel à língua portuguesa ou coloquial?

Ou seja, repleta de gírias, expressões, abreviações, em que a vírgula parece se tornar simbólica e a acentuação parece deixar de ser obrigatória.

O que fazer nesse momento?

Substituir o “kd vc” por “onde você se encontra neste momento”? Ou, quem sabe, trocar o “n da migué” por “não minta para mim”?

A verdade é que ninguém quer um filósofo poeta quando queremos agilidade, velocidade.

Esta é a internet. Cada vez mais rápida, eficiente, veloz, o que exige que a comunicação utilizada seja, da mesma forma, simples e objetiva.

Para acompanhar com facilidade, somente utilizando as boas e velhas gírias, expressões e abreviações.

Contudo, a mesma abordagem que funciona na internet não funciona quando a comunicação exigida é formal e cem por cento fiel à língua portuguesa.

Como fazer isso sem ficar louco, sem errar muito e sem gol contra?

Vamos buscar a resposta.

Uma entrevista exclusiva com Flávia Rita, professora e especialista em língua portuguesa

Por esse motivo, nós convocamos uma verdadeira craque quando o assunto é língua portuguesa.

Erros de português: como evitar esse gol contra?
Arte: © Na cara do gol com Lucas Souza.

Estamos falando dela, .

Graduada em Letras pela UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) e pós-graduada em Didática do Ensino Superior, a camisa 1⚽ de hoje acumula títulos. 🏆

É professora de Língua Portuguesa em alguns dos e proprietária do Centro Educacional Flávia Rita, local em que ministra o renomado curso preparatório com ênfase em concurso público e capacitação profissional.

E, hoje, topou entrar em campo para responder às principais perguntas sobre o tema e acabar com as principais dúvidas em relação à nossa abordagem e utilização da língua portuguesa em nosso dia a dia, pessoal e profissional.

Vamos lá?

Apita o árbitro. Bola em jogo!

Dizem que a língua portuguesa é a mais difícil do mundo. É verdade?

Não é verdade. Cada idioma tem suas particularidades.

Temos elementos incomuns a outras línguas, como o acento grave e algumas declinações verbais mais específicas. Isso, no entanto, não torna o português a língua mais difícil do mundo.

A dificuldade em algo é sempre um ponto de subjetividade.

Para outros falantes de línguas neolatinas, o português não traz grandes novidades nem se mostra muito complexo. Já para orientais, afeitos ao mandarim ou ao árabe padrão, é possível que o português traga desafios maiores.

O português está entre as 10 línguas mais faladas no mundo.

Somos cerca de 250 milhões de falantes entre nativos e não nativos.

Temos países que se valem do português como língua oficial em quase todos os continentes.

Hoje é a língua oficial de 9 países divididos entre Europa, América, África e Ásia.

O maior expoente em termos de extensão territorial e número de falantes é o Brasil (claro!). Além disso, é a língua mais falada no hemisfério sul.

Nosso idioma tem status oficial também em Portugal, Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Timor Leste, Guiné Equatorial, Macau, Cabo Verde e São Tomé e Príncipe.

Em sua opinião e experiência, quais as maiores dificuldades ao aprender o idioma?

Um ponto melindroso é a ortografia.

Temos diversos fonemas representados pela mesma letra, e palavras da mesma família nem sempre seguem o padrão gráfico previsto pelo usuário.

Temos -x com som de -z (como em “exame”) e -s com som de -z (como em “casa”). Isso é natural, mas oferece dúvidas tanto aos falantes nativos quanto aos que se dispõem a aprender nosso idioma.

Por exemplo, o substantivo catequese é escrito com s. No entanto, a grafia correta do verbo catequizar é com z.

A confusão acontece porque seria lógico que as palavras da mesma família apresentassem o mesmo registro.

No caso, o radical da palavra “catequese” é “catequ”, sendo esse um sufixo. Assim, o correto é mesmo se acrescer -izar ao radical (que não apresenta -s).

Nosso sistema de artigos também é complexo.

Temos gênero para quase todos os substantivos (e isso não é simples). Temos palavras cujo gênero oferece dúvida até para os que amam a nossa língua.

Ao sentir “pena” de alguém, devemos dizer “o dó”. Assim, um falante deve expressar seus sentimentos dizendo que “tem muito dó” daqueles que não têm oportunidade de estudar.

A flexão verbal também oferece particularidade que causam dúvidas.

O verbo “haver”, com valor existencial, não se flexiona, mas seu sinônimo “existir” varia.

Logo, devemos dizer “há particularidades na língua” ou “existem particularidades na língua”.

Claro que há explicações para quase todas as exceções ou curiosidades da nossa língua. Mas, para o usuário padrão, as dúvidas imperam.

Nosso escopo de regras gramaticais é extenso (se comparado, por exemplo, ao inglês).

Também temos um vocabulário muito amplo e semanticamente variado, o que pode gerar mais dificuldade de aprendizado.

No inglês, por exemplo, existem metodologias e técnicas para aprender o idioma. Na língua portuguesa, isso se aplica? Existe isso também?

Existem, para todos os conteúdos, formas diferentes de ensinar.

A eficiência de cada uma delas depende da adaptação do aprendiz.

As metodologias de ensino devem ser diferentes, por exemplo, para falantes nativos e para não nativos.

O objetivo do aprendizado também deve ser levado em consideração.

Trata-se de uma alfabetização regular (ou seja, na idade certa)? Trata-se de uma alfabetização tardia?

É para um concurso? É para escrever melhor? É para desenvolver habilidades comunicativas no ambiente de trabalho?

Para cada uma dessas situações, existem metodologias eficientes e diferentes.

Só não acredito em milagre.

Todo aprendizado é construído gradativamente e requer o envolvimento do aprendiz e do tutor.

O que mais prejudica o aprendizado da língua portuguesa?

Nosso ensino, como um todo, é frágil. Indicadores do PISA demonstram isso.

Nossa educação básica tem falhas que inviabilizam, muitas vezes, a alfabetização plena.

Hoje, a falta de foco na educação básica é o maior entrave ao aprendizado efetivo de língua portuguesa.

Há alunos que chegam à graduação sem condições de redigir ou de compreender um texto. Esse cenário é um desafio para o ensino de língua materna e para o sucesso da educação brasileira.

“Escrevi, publiquei, e cometi um erro, um gol contra”. Como dar a volta por cima para não errar novamente da mesma forma?

Todos nós, em algum momento, vamos errar algo ao escrever um texto. Isso não deve ser tratado como um problema.

Erramos por falta de atenção ou por desconhecimento da regra.

Em caso de “gol contra”, o importante é gerar consciência acerca do erro para não cometê-lo novamente.

Se escrevi, por exemplo, “paralização” em vez de “paralisação”, devo registrar a grafia correta ao tomar conhecimento do erro.

Nossa memória — tanto para a grafia quanto para a sintaxe — tende a reproduzir padrões. Isso significa que, em regra, erramos sempre as mesmas coisas.

Para mudar esse cenário e “vencer o jogo”, precisamos analisar o erro e construir um novo padrão a partir dele.

Algumas pessoas cometem erros e sequer percebem que cometeram. Como fazer para que isso não aconteça?

Se a pessoa não possui consciência do erro, podemos orientá-la.

Claro que sair corrigindo todo mundo não é uma atitude elegante.

Mas fazer apontamentos como crítica construtiva, seja no trabalho seja em casa, pode ser positivo para quem os recebe.

Vale uma consideração: ninguém erra porque quer.

Imagino que grande parte dos desvios grosseiros que vemos por aí sejam reflexo da falta de um ensino de base eficiente. Isso não se resolve repreendendo o usuário da língua nem com deboche.

O uso mais adequado de um idioma define, inclusive, oportunidades profissionais e o sucesso financeiro de grande parte da mão de obra de um país.

Quem não tem consciência do erro, em geral, não conseguirá corrigi-lo.

Ainda é preciso contextualizar o quanto o domínio de um idioma empodera os cidadãos.

A capacidade de se expressar e a de compreender definem grande parte de nosso potencial.

Errar faz parte. Mesmo professores de língua portuguesa erram. Esse não é o problema.

Os erros pontuais são corrigidos e superados.

A questão é outra. Muitos usuários não dominam a língua a ponto de serem prejudicados por isso.

Pessoas são excluídas de entrevistas porque falam ou escrevem errado, são enganadas porque não compreendem um contrato, são manipuladas porque não decodificam mensagens de modo adequado (e por aí vai).

Você concorda com o uso da língua de forma coloquial, informal, no dia a dia, nas redes sociais e demais aplicativos de mensagens?

Concordo. O uso coloquial não é errado. Faz parte da situação comunicativa concreta.

A adequação linguística é essencial em qualquer situação.

Usar expressões informais, uma linguagem mais afetiva ou símbolos não empobrece nosso idioma nem evidencia falta de conhecimento linguístico.

Agora, temos que separar o uso informal da falta de coerência, da falta de coesão ou mesmo dos desvios ortográficos observados nas redes sociais.

A comunicação é fluida e deve se ajustar ao público, à situação comunicativa e até mesmo ao suporte usado. Isso não significa, por exemplo, que devemos naturalizar grafias incorretas ou falhas de concordância ou a falta de lógica de um texto.

Os problemas linguísticos mais graves não têm relação com a situação comunicativa.

Em regra, refletem uma alfabetização inadequada e a falta de acesso do indivíduo à cultura de letramento. Abreviar vc, tb ou blz não demonstra que o usuário desconhece o padrão.

É muito provável que, em situações de formalidade, o comunicador se atenha às formas desenvolvidas (você, também e beleza).

Por outro lado, quem escreve “excessão” ou “análize” (no lugar de “exceção” e “análise”) tende a reproduzir esses desvios gráficos até mesmo em situações de formalidade.

E você acredita que o uso da língua de forma coloquial ou informal no dia a dia pode atrapalhar na hora que devemos usar uma linguagem formal?

Costumo brincar que a língua é como um “guarda-roupa”.

Para cada situação, vamos escolher as melhores peças.

Não acho que as pessoas misturam os contextos discursivos.

Em geral, dominamos as situações e sabemos ajustar a língua às nossas necessidades.

A roupa de trabalho (em regra) não é a mesma do lazer ou da festa de fim de ano. Na comunicação, vale o mesmo. Levamos em consideração o interlocutor, o tema, o contexto como um todo.

Corrijo textos e mais textos de alunos do Brasil inteiro.

As falhas não estão ligadas à linguagem coloquial ou ao ambiente virtual. As falhas refletem níveis diferentes de alfabetização e de oportunidades.

Há alunos com dificuldade para estruturar uma ideia, com desvios ortográficos e sintáticos graves. Isso não tem relação com adequação linguística.

Separamos bem o contexto de comunicação.

“Leio 4 ou 5 vezes tudo que escrevo para ter certeza de que não errei nada”. Como se livrar dessa paranoia gramatical e tornar a escrita mais leve?

Não tenha medo de errar. Na verdade, tenha a certeza de que, em algum momento, você vai errar.

Um redator, um escritor, um jornalista ou um usuário padrão da língua estão sujeitos ao erro.

A escrita não pode se tornar um peso.

O medo de errar não pode nos paralisar. Nesse caso, considero que aceitar que o erro faz parte do processo comunicativo (sem perder o zelo com o texto) seja uma boa opção.

Ler 4 ou 5 vezes o texto é paranoia, mas revisar não.

Releia o texto. Faça os ajustes e siga para a próxima tarefa.

Se alguém apontar um erro, agradeça a colaboração. Faça a retificação no texto e, principalmente, não sofra.

Como já disse, errar não é o problema, sequer evidencia falta de domínio.

Errar faz parte da tarefa de se comunicar (só não pode virar hábito).

Para quem ainda não se dá bem com as regrinhas da língua portuguesa, o que fazer para tornar-se um craque no assunto e vestir a camisa 10?

Estudar e treinar.

A prática é essencial para a fluência em regras.

Ler bons autores, desenvolver autocrítica em relação ao uso do idioma e buscar boas referências são estratégias para quem deseja se tornar um camisa 10!

Você é especialista em concursos e vestibulares. Quais dicas você dá para quem está estudando para uma prova como essa?

Trata-se de um estudo específico e direcionado.

No contexto dos vestibulares e dos concursos, a concorrência é altíssima.

As provas de língua portuguesa e de redação são decisivas nesses cenários.

O mais importante, na situação de prova, é saber como “você” será cobrado.

Cada organizadora aborda o conteúdo programático de um jeito.

O ideal é o aluno se familiarizar com a linguagem da banca.

Claro que um bom professor e um bom material podem ajudar. Mas é essencial que o candidato compreenda como a sua banca trabalha.

O Enem tem suas particularidades, como pouca gramática, muita interpretação de texto, muitos gêneros diferentes na prova e uma redação dissertativa com estrutura bem peculiar (por ter de apresentar proposta de intervenção).

O Cebraspe pede uma redação muito mais expositiva que dissertativa, a gramática aparece diluída nas questões de texto e, no geral, as provas são consideradas complexas.

A FCC pede uma gramática mais tradicional e uma redação pautada em temas filosóficos.

Cada caso é um caso e, por isso, dominar a banca é essencial.

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Agora, sim. Fim de jogo.

Vai começar a resenha do Na cara do gol com Lucas Souza, e quem comanda é você!

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